Nós, pesquisadores/as e
docentes de diferentes regiões do Brasil e de outros países, manifestamos nosso
total apoio ao movimento pela manutenção da Festa da Chiquita em seu lugar
tradicional de manifestação.
Para quem ainda não sabe,
ou insiste em não reconhecer, a Festa da Chiquita é uma das primeiras
manifestações do Movimento LGBT latino-americano, iniciada
há mais de 30 anos, mais precisamente em 1976.
É um
evento que reúne artistas, intelectuais, jornalistas, e população em geral,
tendo como ponto de concentração
o “Bar do Parque”, situado na Praça da República, em Belém do Pará, Norte do
Brasil. Trata-se de um espaço tradicional de acolhimento das pessoas
consideradas “à margem” da sociedade, seja por sua condição econômica e/ou por
sua orientação sexual ou identidade de gênero (Vale
a pena conferir um trecho do premiadíssimo documentário de Priscila Brasil).
Originalmente,
como ato de resistência criativa, aos poucos, a festa foi sendo incorporada ao
Círio de Narazé, uma das maiores manifestações católicas do mundo. Em 2004, A Chiquita foi
reconhecida como patrimônio imaterial da humanidade pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Assim, a Festa da Chiquita
é uma manifestação promovida pelo Movimento LGBT paraense mas, há tempos, não é
destinadamente exclusivamente ao público LGBT. É uma festa inclusiva que, antes
de tudo, promove uma importante e necessária aproximação entre campos
extremamente relevantes no nosso cotidiano (arte, sexualidade, religiosidade e
política) afastados por interesses morais que buscam manter algumas tradições e
práticas discriminatórias.
Infelizmente, são muitas as
dificuldades pelas quais passam todos os anos Eloi Iglesias e colaboradores
para organizar a festa e conseguir as licenças para realizá-la. Sem nenhum
adereço, desmontado, ele caminha e estabelece seus pontos de conexão política,
e a partir de gestos amigáveis, olhares aprazíveis, atitudes jocosas, risos e
comentários preconceituosos, Eloi constrói redes que são alimentadas e
acionadas na primeira semana de outubro, ano após ano.
Este ano, mais uma vez,
rondam boatos e rumores sobre o destino da Chiquita. Dessa vez, a estratégia
para extinção é mais torpe. Falam em mudar seu endereço, descaracterizando,
assim, um dos seus mais potentes efeitos simbólicos: estar na “praça do povo” e
num dos pontos do trajeto (trasladação) do Círio de Nazaré. Deste lugar, é
possível, ver a passagem da santa e reverenciá-la, antes de começar a “temporada
de caça”, como ironicamente costuma anunciar Eloi.
Os argumentos para deslocar e/ou extinguir a
Chiquita estão sempre embasados em uma equívoca separação entre o sagrado e o
profano e a tentativa de afastar esses dois “uni-versos”.
Vale lembrar que, como adverte o historiador
Geraldo Mártires Coelho (1998), os primeiros Círios tanto em Belém do Pará como
em Portugal estiveram embebidos de coisas sagradas e profanas em suas
constituições, como extensões um do outro e não como oposições.
Infelizmente, o contexto
político atual da capital paraense se assemelha a um novelo que se faz e desfaz
por conveniências, ou simplesmente por uma proposital vinculação da Festa ao
que consideram como o profano, o esquerdo, o sujo, o anormal, o desprezível, aquilo
que deve ser expurgado dos “ambientes familiares”.
A Festa da Chiquita não pode ser medida por uma
suposta competição com a santa padroeira dos paraenses, Nossa Senhora de
Nazaré, e muito menos por uma balança que mede o quanto de sagrado e profano ela
carrega; não estão em jogo aproximações perversas acionadas para explicar
eventos tão singulares e que fazem parte da cultura de um povo.
Eventos, sejam quais forem, não podem ser
descaracterizados e reposicionados ao bel prazer de terceiros. A, aparentemente
simples, mudança do local para a realização da festa promove de modo negativo
uma descontinuidade histórica, passa por cima de lutas diárias por
reconhecimento, por exemplo, de lésbicas, gays, bissexuais, travestis,
transexuais, transgêneros, intersex, e tantas outras denominações sobre exercício da sexualidade e das
identidades de gênero. Esta mudança é, portanto, um desserviço histórico,
social e cultural.
Sim,
desculpe-nos, mas às vezes, é preciso não acomodar-se, incomodar... para se
fazer existir. Vida longa à Festa da Chiquita e que seu lugar sempre seja o do
(in)cômodo!
Prof.
Dr. Benedito Medrado (UFPE)
Prof.
Ramon Reis (USP)
Prof.
Milton Ribeiro (UFPA)
Prof. Dr. Ernani Pinheiro Chaves (UFPA)
Prof. Dra. Mônica Conrado (UFPA)
Profa. Dra. Maria Lúcia Chaves Lima (UFPA)
Prof. Dr. Julio Simões (USP)
Prof. Dr. Regina Facchini (UNICAMP)
Profa. Dra. Isadora Lins França (UNICAMP)
Prof.
Dr. Jorge Lyra (UFPE)
Prof.
Dr. Luiz Felipe Rios (UFPE)
Prof.
Dr. Gustavo Gomes da Costa (UFPE)
Prof.
Dr. Rafael Diehl (UFPE)
Prof.
Dr. Ricardo Pimentel Méllo (UFC)
Prof.
Dr. Henrique Caetano Nardi (UFRGS)
Profa.
Dra. Mónica Lourdes Franch Gutiérrez (UFPB)
Prof.
Roberto Efrem Filho (UFPB)
Profa.
Dra. Maristela de Melo Moraes (UFCG)
Profa.
Dra. Telma Low (UFAL)
Profa.
Dra. Daniely Sposito (IFPE)
Profa.
Edna Granja (FIOCRUZ/RJ)
Prof.
Dr. Emerson Rasera (UFU)
Profa. Dra. Berenice Bento (UFRN)
Prof. Dr. Marco Aurélio Prado (UFMG)
Profa. Dra. Vera Paiva (USP)
Profa. Dra. Berenice Bento (UFRN)
Prof. Dr. Marco Aurélio Prado (UFMG)
Profa. Dra. Vera Paiva (USP)
Prof.
Dr. Marisela Montenegro (UAB - Espanha)
Prof.
Dr. Joan Pujol (UAB - Espanha)
Prof.
Dr. Conceição Nogueira (Univ. Porto - Portugal)
Prof.
Nuno Santos Carneiro (Univ. Porto - Portugal)
Prof. Dr. João Manuel de Oliveira (ISCTE-IUL)
Prof. Dr. Sérgio Aragaki (UFT)
Prof. Dr. João Manuel de Oliveira (ISCTE-IUL)
Prof. Dr. Sérgio Aragaki (UFT)